quarta-feira, 10 de maio de 2017

BETWEEN US - Capítulo 3

Domingo, 26 de abril. 10:10 

     Antes de fazer o que estava planejando, comi e fui tirar uma dúvida que estava me matando: se eu estava com Dinah aquele dia. Liguei para ela e nada. Deixei várias mensagens e não respondeu. O único jeito era ir na casa dela, mas antes passaria na de Lauren. Estava nervosa, tremendo e suando frio. Minha respiração totalmente descompensada e meu coração a mil por hora. Saí de casa em passos curtos enquanto várias lembranças daquele dia passavam pela minha mente. Por que ela saiu daquele jeito? Por que ela mora naquele lugar? A garota misteriosa e ela eram a mesma pessoa? 
Devo ter demorado dez minutos para fazer uma coisa de trinta segundos. Encarei aquela porta pela segunda vez e diferente da primeira vez, eu bati. Uma, duas, três. Estava prestes a desistir quando congelei ao ouvir a voz que veio por trás de mim. 

     - Me procurando? 

     Ao encarar aqueles olhos verdes tudo ficou em câmera lenta. Era inaceitável pensar que poderia existir alguém mais linda que aquela mulher. Desta vez com o cabelo solto e um batom vermelho. Novamente eu travei ao vê-la. Respiração ofegante. Suor. Tudo normal. Ela pelo contrário estava serena e calma. Me olhava esperando uma resposta, e depois de um tempo, respirei fundo e dei um sorriso de canto. 

     - Eu queria me desculpar pelo que aconteceu. - abaixei a cabeça envergonhada - E te entregar seu cachecol. - estiquei a mão para entrega-la -

     - Obrigada. Eu estava procurando ele - deu um sorriso animado - E está tudo bem, já passou. Me desculpe por ter saído daquela maneira. Tenho a péssima mania de desaparecer. - disse levantando uma sobrancelha e passando a língua nos lábios como de costume - Quer entrar? 

     Eu poderia dizer não, já que estava tudo resolvido. Eu poderia não me envolver mais com ela, pois sabia que algo estava errado. Eu disse sim por pura falta de respeito a mim mesma. Ela passou na minha frente e abriu a porta. De novo eu me assustei ao olhar lá dentro. O lado de fora ainda estava aos pedaços, porém ao interior estava impecável. Depois daquilo só havia uma explicação: eu havia sonhado. Tudo aquilo foi apenas um sonho ruim e equivocado. Respirei de alívio e todas aquelas perguntas sumiram da minha cabeça. 

     - Eu não fiquei chateada pelo que disse. - disse me tirando dos meus pensamentos - Qualquer um que olhe o estado da casa por fora, imaginaria o pior aqui de dentro. Quando cheguei estava bem ruim, mas dei um jeito. - dizia enquanto abria as janelas - Eu não tinha muito dinheiro guardado e ainda não tenho um emprego fixo, então só arrumei aqui dentro. Lá fora talvez demore um pouco mais. - respirou fundo e se virou para mim dando um sorriso de orelha a orelha - Pensei que não falaria mais comigo pelo que houve. 

     - Mesmo assim, me desculpe novamente. - disse um pouco sem graça - Eu gostei bastante. - olhei em volta para não encara-la - Eu realmente não ia, mas não por sua causa e sim por mim. Eu fui idiota. 

     - As duas foram, então estamos quites. 

     Acho que tudo estava bem de novo. Era impressionante como a conversa entre a gente fluiu com tanta naturalidade. Ela era muito divertida e super inteligente. Eu mal conseguia acompanha-la, mas ela tinha muita paciência e me explicava tudo. Ficamos conversando por bastante tempo até que ela foi pegar alguma coisa para comermos. Peguei meu celular e vi algumas mensagens de Dinah. Ufa. 

      - Eu estou bem. Estudando demais, mas bem. 
      - Estou morrendo de saudades de você, garota. Vamos sair no próximo final de semana. Sábado, cinema às 20:00. Se você recusar nunca mais converso com você. Eu te amo.

     Comecei a rir ao ler a mensagem e respondi um "ok, eu te amo". Não tinha como recusar os convites dela. Éramos amigas há anos e ela sempre foi assim, louca. Sempre esteve comigo nos melhores e piores momentos em que ela me metia. 

     - Rindo de que? - ela disse me tirando novamente dos meus pensamentos - 

     - Da minha amiga. - disse em meio a risadas - Ela é hilária. 

    - Imagino, para estar rindo assim. - disse me entregando um pacote de salgadinhos e um refrigerante - Desculpe é só o que tem. 

     - Não tem nada melhor que isso. - tentei anima-la - 

     - Se você não se importar com a saúde, sim. - riu - Vou fazer compras. Amanhã talvez. - olhou para cima como se estivesse querendo dizer algo - 

     - Quer companhia? - perguntei enchendo a boca de salgadinhos e ela assentiu envergonhada - Amanhã depois do trabalho passo aqui e vamos. 

     Ela deu um sorriso de canto e disse que já voltava. Não sei o que ela tinha, mas era maravilhosa. Me levantei para olhar a janela do fundo, a única que ela não abriu. Tentei abrir, mas estava emperrada. Agora estava explicado. Abri a cortina e olhei através do vidro. Nos fundos havia um quintal com algumas flores murchas, duas arvores médias e um balanço. Não era de todo ruim, com um pouco de cuidado ficaria muito bonito. Depois de uns segundos observando me afastei do vidro e no maldito reflexo a vi novamente. Parecia com Lauren, porém mais assustadora. Eu não conseguia parar de olhar e nem me mover. Era ela, a garota que eu sempre via às 22:42. Meu coração disparou dessa vez com mais intensidade, comecei a hiperventilar e fechei os olhos. Ao sentir uma mão gelada em meu ombro dei um grito. 

    - Meu Deus. Calma. Sou eu, Lauren. O que houve? Por que gritou? 

    Olhei rapidamente para ela que estava assustada e com os olhos arregalados. Minha única reação foi ajoelhar no chão, colocar a mão no rosto e começar a chorar desesperadamente. 

     - Camila, me diz o que aconteceu? Por que está assim? 

    Lauren perguntava e eu sequer conseguia explicar o que estava acontecendo. Meus gritos ecoavam pelos cantos da casa e eu não conseguia parar, até que senti seus braços me envolverem e sua cabeça repousar em meu ombro. Abri os olhos e ela estava ajoelhada na minha frente, me abraçando bem forte. Fechei os olhos novamente e retribui o gesto. Tudo que estava sentindo foi parando aos poucos. Agora o que sentia era seu abraço e sua respiração em meu pescoço me fazendo arrepiar. Não sei dizer o tempo exato em que ficamos ali, mas foi o abraço mais longo da minha vida. Era como se ela estivesse esperando o momento certo para me soltar, e enquanto esse momento não chegasse ela continuaria ali. Mais um pouco e ela me soltou e me encarou. Limpei minhas lágrimas e a encarei de volta. Lauren se levantou e estendeu a mão para me ajudar, segurei a mão dela que me guiou até o sofá. 

     - Você não sai daqui hoje, até me explicar o que houve. - disse séria - 

     - Não sei como te explicar. - disse com a voz fanha - 

     - Tente. - disse e se aproximou mais - Vou tentar te entender. 

     Ela me passava uma enorme confiança. Com certeza não sairia dali até entender o que estava acontecendo. Tentei explicar desde o começo, detalhe por detalhe sem esconder absolutamente nada. Ela me olhava com atenção e sem dizer nada. Quando terminei de falar ela respirou fundo e sorriu. 

o que pode ocorrer é uma fixação em determinados pensamentos e sentimentos que podem gerar a certeza de que são reais.

+info: http://www.doctoralia.com.br/enfermidade/transtornos+de+ansiedade-17492/pergunta/excesso-de-ansiedade-causa-alucinacao-667731
     - Você está passando por algum momento difícil na sua vida? - perguntou me olhando fixamente nos olhos - 

     - Que eu saiba não. - a olhei sem entender nada - Por que?

     - Ah, sim. - disse mordendo o lábio - As vezes quando uma coisa ruim acontece com frequência ou só uma vez suficiente para te deixar mal, pode te deixar nervosa e ansiosa. Alguns pensamentos se tornam fixos e recorrentes, fazendo você acreditar que aquilo é real. 

     Eu suspirei e não disse nada. Lauren foi muito atenciosa e conversou comigo tentando encontrar uma solução cabível. Já estava ficando louca com tantas perguntas e teorias que não acabavam nunca. No final, ela me fez prometer que iria a um especialista ver o que estava havendo. Horas depois, voltei para casa. 

Segunda-Feira, 27 de abril. 07:00

     Acordei com uma sensação muito boa. Sabia que havia sonhado com algo bom mesmo não conseguindo lembrar de nada. Não tinha demorado a dormir como nos outros dias, mas estava com muito sono. Fiquei mais um pouco na cama reclamando, até lembrar que era meu primeiro dia de trabalho. Merda. Levantei como um foguete, tomei banho, me arrumei e peguei uma maçã que estava na mesa para comer no caminho. 

     Cinquenta minutos depois finalmente havia chegado. Entrei naquele prédio enorme sem saber o que fazer. No papel que me entregaram dizia: "Quinto andar, sala 221". Entretanto não fazia ideia de onde era este lugar. Estava completamente perdida e era tímida demais para perguntar a alguém. Felizmente uma moça que estava na porta quando entrei veio falar comigo. 

     - Olá. - disse sorrindo - Parece um pouco perdida. 

     - Oi - sorri sem graça - Estou completamente perdida. 

     - Acontece bastante. Meu nome é Allyson. 

     Allyson era o tipo de garota que todo mundo adora por ser meiga e atenciosa. Sempre buscava ajudar todos como podia e tinha um belo sorriso. Era constantemente confundida com alguma criança por ser pequena. Ela me explicou exatamente onde era para ir e me deu algumas dicas de como me portar. Ao achar a sala, me deram algumas instruções e disseram que no primeiro mês assistiria a algumas aulas para entender melhor como tudo funcionava. Depois me mandaram para o andar de cima, sala 305 onde teria as aulas. Uma mulher de uns trinta anos nos instruiu, disse que era nossa madrinha e que nos explicaria e ajudaria no que fosse preciso. 

     Na sala de aula, duas pessoas me chamaram atenção: uma garoto de olhos claros, cabelos bagunçados e loiro. E uma garota negra, presença forte, linda e muito simpática. Os dois pareciam se conhecer e eram os destaques da turma. Sempre respondiam e conversavam com a madrinha. Eu sendo eu, não fui com a cara de nenhum dos três.

      No intervalo queria agradecer Allyson novamente pelo favor, mas não a encontrei. Me sentei em um banco isolado no pátio e tentava ignorar meu estômago que estava reclamando de fome. Como saí rápido, esqueci o dinheiro em casa. Teria que aguentar. Olhei para a saída do pátio e vi Allyson vindo em minha direção, dando pulinhos.

     - Por que está sozinha? - perguntou se sentando ao meu lado - 

     - Não conheço ninguém - dei de ombros - E você? 

     - Você me conhece. - disse e cruzou os braços - E não estou sozinha, estou com você. 

     - Me desculpe - disse e senti minha bochecha queimar - Eu não costumo me dar bem com as pessoas e quando acontece sempre faço alguma coisa errada. 

     Quando disse isso pensei em Lauren. O que ela devia estar fazendo? 

     - Você ouviu o que eu disse? 

     - Hm? 

     Olhei para Allyson que me tirou de meus pensamentos e estava com cara de brava. Me desculpei novamente e começamos a conversar. Ela me deu metade de seu lanche e mesmo recusando mil vezes ainda me obrigou a comer. Infelizmente ela não era da minha sala pelo fato de estar a mais tempo por lá. Quando bateu o sinal voltamos para sala e no último tempo, o garoto que havia reparado não parava de me encarar. Me olhava e cochichava algo com a outra garota. Estava ficando incomodada. Vi os dois levantarem e virem em minha direção. Droga. Quando iam dizer algo o último sinal tocou e deixei a sala correndo sem olhar para trás. 

     

 


   
o que pode ocorrer é uma fixação em determinados pensamentos e sentimentos que podem gerar a certeza de que são reais.

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